Primeira metade do século XX.
“Pretende-se neste artigo analisar alguns álbuns fotográficos que integram uma genealogia da imagem de Moçambique entre 1887 e 1929. A cronologia refere-se a um período de afirmação de Portugal em territórios africanos – especialmente em Angola e em Moçambique – disputados por outras potências europeias, nomeadamente Inglaterra e Alemanha. À medida que a corrida à África se intensificava, a fotografia manifestou-se como um poderoso aliado de uma política de fixação territorial e administrativa, no intuito de inventariar e registar os locais e os seus habitantes. Organizadas em álbuns fotográficos, as fotografias revelam um conjunto de vistas de Moçambique, nomeadamente de Lourenço Marques. Esse registo pretendia revelar uma África cosmopolita à luz de projetos “modernistas”. No fundo, uma África branca que se sobrepunha a uma África negra e primitiva”.
Anoto eu que se não tivesse sido Portugal a colonizar os povos nos territórios que hoje constituem Moçambique – por alguma decisão incompreensível para a época, que tivesse sido tomada com base na mentalidade de hoje – teria sido a Inglaterra ou, menos provavelmente, a Alemanha!
“[…] A ligação do caminho de ferro a um porto marítimo foi crucial para o desenvolvimento do projeto colonial, pois isso significava a circulação de pessoas e de matérias-primas entre o espaço terrestre e o espaço marítimo. A Figura 1 materializa e regista ad eternum a conquista “civilizacional” ancorada num projeto de construção e de engenharia. Esse momento foi registado com a presença de algumas figuras, possivelmente ligadas à empresa Delagoa Bay & East Africa Company, Ltd., de Edward McMurdo. O acto de se fazerem representar nesta fotografia revela uma consciência de participar no registo documental e fotográfico, legitimando-se como intervenientes desse […]”.

“[…] As fotografias publicadas no álbum “A Souvenir of Lourenço Marques: an album of views of the town” oscilam entre aspetos e vistas da cidade de Lourenço Marques, ruas povoadas com europeus e gentes autóctones, evidenciando um certo encontro de “culturas”, edifícios públicos, e algumas fotografias antropológicas, captadas fora da cidade de Lourenço Marques […]”.
“[…] A Figura 2, um aspeto da cidade de Lourenço Marques, mostra não só a circulação de nativos, mas também a particularidade na arquitetura do edifício em destaque no lado direito. Para além do mais, é evidente nesta fotografia a manipulação da imagem no momento de impressão do álbum. Reproduzida, possivelmente, a fototipia, os fotógrafos decidiram acrescentar ou retocar as duas figuras na extremidade de cada margem da imagem: do lado esquerdo, a figura sentada no passeio; do lado direito a figura de pé, com vestes echapéu branco. Estas figuras desenhadas destacam-se das restantes na composição fotográfica […]”.

“[…] A Figura 3, de autoria de Piedade Pó, reproduzida no álbum n.º 2 de José dos Santos Rufino, é um cliché do Caminho-de-Ferro de Moçambique, datado de 13 de Abril de 1927, e reproduzido no “The Delagoa Directory. A year book of information regarding the town and port of Lourenço Marques”, coordenado por A. W. Bayly & Co. A
fotografia reproduzida no álbum tem a particularidade de omitir aquilo que consta no canto inferior esquerdo da fotografia publicada no The Delagoa Directory: a proveniência, a referência ao fotógrafo e a sua data. Para além do mais, a fotografia publicada no álbum tem, ainda, um apontamento de sobreposição de outra fotografia, destacando o barco a navegar. Este tipo de montagem e sobreposição de imagens é recorrente ao longo dos álbuns, transmitindo um certo dinamismo na narrativa visual […]”.

Fonte: Revista Outros Tempos – “A Souvenir of Lourenço Marques”: álbuns fotográficos de C. S. Fowler, J. & M. Lazarus e José dos Santos Rufino (1887-1929) – Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa Lisboa, Portugal, artigo de Inês Vieira Gomes


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